domingo, 1 de junho de 2014

DICA CINEMATOGRÁFICA: The Boondock Saints - VERITAS, AEQUITAS e a SHERAZADE

Now you will receive us!
We do not ask for your poor or your hungry. We do not want your tired and sick. It is your Corrupt we claim!

 MacManus's Brothers -The Boondock Saints


The Boondock Saints, de direção e roteiro de Troy Duffy, é um filme que, apesar de sua idade(ele foi aos cinemas em 1999) e seu tom absolutamente despretensioso, remanesce ao tempo e à própria obsolescência, devido ao seu preciosismo artístico e ao fato de mostrar de forma crua e bem humorada a vulgarização da violência e o anacronismo, senão puramente loucura, existente em qualquer conceito de justiça privada(justiça com as próprias mãos), ou de "justiceiro".

Passando ao enredo, esse se centra nos irmãos Muphy, interpretado por Norman Reedus, e Connor MacManus, interpretado por Sean Patrick Flanery, dois devotos católicos irlandeses, moradores da periferia de Los Angeles(L.A). Sem dar muitos detalhes sobre a trama(tenho o mal costume de praticamente distribuir spoleirs), em um dado momento do filme, ambos têm uma espécie de epifania religiosa, que lhes faz acreditar que possuem a missão divina de limpar o mundo do pecado, mesmo que seja através da violência. É bom mencionar, que pouco antes dessa cena, houve uma sequência onde os dois assistiam a uma missa, onde o sacerdote em sua pregação, afirmava que a doença daquele tempo, seria a apatia que todos apresentavam quanto ao sofrimento e injustiça que ocorria com o próximo. Dessa forma, se delineia a justificativa moral(embora não muito sólida), que fundamentará toda a violência praticada pelos protagonistas, qual seja, trazer a justiça dos céus à terra(acho que houveram uma ou duas cruzadas com um objetivo mais ou menos parecido...).


É bom mencionar, que o filme desde o início trás toda uma carga simbólica que serve para dar mais verossimilhança à suposta missão sagrada a qual os dois(psicóticos e sociopatas, não existe outro nome para eles) irmãos foram "encarregados". Um dos elementos simbólicos citados mais marcante,  são as tatuagens que ambos possuem em suas mãos. Na mão direita de um deles está escrito Veritas, enquanto que na mão esquerda do outro está escrito Aequitas, palavras que traduzidas do latim para o português, querem dizer Verdade e Justiça. Levando em conta que no filme, após cada "justiçamento" os dois protagonistas concediam a extrema unção aos agonizantes(aos que eles deixaram agonizantes), e colocavam moedas em cima dos olhos dos cadáveres(Na mitologia grega, acreditava-se ser necessário pagar uma taxa ao barqueiro Caronte para se chegar ao mundo dos mortos), se torna claro o caráter que ambos possuem, de não só aplicadores da justiça divina na terra, mas também de guardiões das portas da morte. Dessa forma, mais do que meramente dois malucos em meio a um terrível acesso psicótico, eles representam no filme, uma força natural, quem sabe divina.

A prova viva da multiplicidade de sentidos e usos para o termo "fuck"
Não sou capaz de comentar isso...

Menções honrosas que não posso deixar de fazer, são merecidas aos atores David Della Rocco, que interpreta um amigo dos irmãos MacManus(todo mundo tem um amigo que é péssima influência), e Willen Dafoe, que interpreta um agente do FBI que encarregado de investigar a máfia de L.A e acaba inevitavelmente esbarrando com os protagonistas. A propósito, a interpretação dele no filme está incrível! Embora ele tenha uma certa tendência para o overacting, nesse filme ele chegou a níveis somente alcançados pelo afamado, pelo inesquecível, pelo único ser humano sem nenhuma expressão facial, Nicolas Cage(não que eu ache isso ruim, normalmente eu adoro overacting).  Não posso esquecer também de George Martin, digo, Billy Connoly, que interpreta Il Duce, um assassino da máfia encarregado de tirar os irmãos MacManus do mercado de serviços de limpeza divino.
Admitam, ele é a cara do George Martin!!!

E tem uma capacidade de matar coisas equivalente à que o George Martin também tem para matar personagens de GOT. 

Voltando ao filme, é claro que ele não é perfeito e possui partes que se não são confusas(e nem estou falando de erros de continuidade), no mínimo indicam que o Troy Duffy não estava completamente sóbrio quando escreveu o roteiro. A própria narrativa, que embora engate lindamente a partir do meio até o final do filme, é um bocado truncada de início, embora esse seu caráter menos palatável tenha lá sua função na trama. No entanto, raramente um filme está isento de erros e mau planejamento, sendo que mesmo a ocorrência de alguns desses no filme, não atrapalha em absolutamente nada o filme, já que se inserindo entre os filmes de ação dos anos 1990, tais falhas e exageros se não já esperados, são essenciais ao "charme" do filme.
Não me olhe assim! O filme é bom... eu asseguro!
Curiosamente, uma das melhores sequências do filme, não faz realmente parte dele, digo, o filme tecnicamente já acabou quando ela se inicia. Estou falando, claro, dos créditos que, no filme em comento, passam lentamente pela tela, dividindo o espaço com uma suposta entrevista de vários populares sobre sua opinião desses quanto às  recentes atitudes dos protagonistas. Nesse momento, se mostraram, em um belo simulacro da vida real, duas reações básicas: ou a concordância extrema com a "justiça" aplicada pelos irmãos MacManus(as vezes o sujeito se prontificava a os ajudar, até), ou a total discordância quanto a essa. Havendo, claro, aqueles que decidiram simplesmente não se pronunciar sobro o assunto, embora eu não esteja os considerando aqui. No entanto, achei esse momento do filme particularmente interessante, porque ele nos remete a um um acontecimento relativamente recente, mais precisamente, a todo aquele alvoroço provocado por algumas afirmações da repórter Rachel Sherazade, na época âncora do Jornal do SBT, e suas possíveis consequências posteriores(a propósito, minha reação na época foi a seguinte). Ao que me lembre, assim como no filme, as reações ao ocorrido variaram de uma concordância raivosa até a discordância absoluta. No entanto, o que sempre me deixou curioso naquela época, assim como ainda me chama a atenção, é a razão de alguém seguir uma ou outra corrente, uma ou outra linha de opinião. Porque aqueles que concordam com o "justiçamento", tecnicamente estão concordando com atitudes se não equivalentes, possivelmente até mais gravosas do que aquelas que estariam sendo vingadas, digo, "justiçadas". No entanto, e aqueles que terminantemente discordassem do linchamento? É certo que estariam tendo uma reação mais racional, mas ao mesmo tempo, não seria indício de alguma frieza? Não é a irracionalidade um sinal da emoção, da empatia pelo próximo? A ausência dessa, tanto quanto o seu excesso, não seria também absolutamente preocupante?

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Deixando a parte minhas extravagantes viagens mentais, recomendo sinceramente esse filme. Ele é relativamente curto, o enrendo tem uma premissa interessante e, como um todo, eu achei, e essa é apenas minha opinião, o filme razoavelmente bom. Melhor que a média, na verdade. Como de costume, segue o trailer para os interessados.



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