sexta-feira, 6 de abril de 2018

DICA CINEMATOGRÁFICA: ELE ESTÁ DE VOLTA - Mídia, Fascismo e Bigodinhos na Sociedade Contemporânea


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Ele está de volta, mais uma vez
Ele está volta, é o que eles me dizem
Que ele não estava comigo, então eu não entendo"
 Marion Maerz. Er Ist Wieder Da

Mr. Hitler, you know you ain't so keen
Mr. Hitler, you know you ain't so keen
But we American people say you're the biggest liar they have ever seen.

Em meio a cinzas, brasas fumegantes e resquícios do poço de piche infernal ele acorda. Obviamente confuso, observa a sofisticada Berlin contemporânea estático, mas logo ajeita seu velho uniforme militar em farrapos e se põem em marcha. Hitler is back! Essa é o preambulo do filme Er ist Wieder Da(2015) ou, em português, Ele está de Volta, uma produção alemã, baseada num famoso bestseller homônimo. A ideia básica, tanto do livro quanto de sua adaptação cinematográfica, é mostrar como alguém tão repugnante como Hitler e suas ideias, ainda poderiam ser facilmente assimilados pela sociedade e mídia contemporâneas. O resultado, é um filme que na superfície é uma excelente comédia mas, em camadas mais profundas, é uma críticas mais contundentes à sociedade do espetáculo contemporânea e aos patéticos e assustadores monstros que ela gera. 
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No filme, que é narrado em primeiro pessoa pelo próprio Hitler(esse interpretado primorosamente por Oliver Masucci), a mídia possui um papel central no novo Putsch(golpe) intentado pelo renascido ditador. Mais do que isso, é exatamente pela forma pela qual a mídia contemporânea se organiza, que se chancela desde o início a ascensão meteórica do genocida alemão. Tendo em conta que atualmente existe um clamor pelo estranho, o exótico e o polêmico, figuras caricatas e excêntricas tendem a atrair com mais atenção os holofotes da fugidia atenção pública. Pouco importa a moralidade ou a essência do objeto de  atenção midiático. Desde que o mesmo seja instigante e facilmente palatável, qualquer ação é justificada, como qualquer um pode ver ligando a TV ou abrindo o Youtube. Nesse contexto, Adolf não podia ser tornar menos, do que uma poderosa persona. Inicialmente encarado como um mero e patético louco, passo a passo ele galga até o topo, mobilizado cada vez mais atenção, cativando cada vez mais o público à exemplo de muitos caricatos políticos contemporâneos. No filme, a violência física não é mais a arma do antigo fuhrer, já que essa passou a ser cada vez menos abertamente tolerada pela nossa civilização. Mas é a polêmica, o senso comum e preconceitos que se tornam suas maiores forças. 
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Primeiro como tragédia e depois como farsa, o filme nos permite perceber a fragilidade de nossa sociedade frente a fortes figuras carismáticas, carregadas com discursos que atiçam nossos instintos mais primitivos. Na interação de Hitler com várias pessoas "normais", transparecem preconceitos e falácias comuns à nossa sociedade. A maior parte delas, fundadas sempre no medo inconsciente do novo, do estranho, do imigrante, do homem negro, do outsider. Mais do que um instigador do caos ou um amplificador da violência, o líder nazista se torna rapidamente um elo entre as mais diferentes corrupções do espírito humano. O personagem demonstra que não é apenas ele o monstro, mas que, na verdade, todos possuem um certa monstruosidade em suas almas, e é por causa dessa mácula, que alguém como ele poderia existir.
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Bom, então creio que você, meu caro leitor imaginário, deve estar se perguntando se vou ou não indicar esse filme. E a resposta, obviamente, é: VOCÊ NÃO LEU A P**#** DO TEXTO?!?!? Eu não só indico, como acho que ele deveria ser obrigatório para todo mundo. Particularmente hoje em dia, quando a polarização das redes sociais e a superficialidade do discurso político contemporâneo geraram a ascensão de um certo político cujo nome não quero comentar(dica, o nome dele começa com uma das primeiras letras do alfabeto), mas que na minha humilde opinião de merda é a encarnação viva da espetacularização circense e do esvaziamento moral da política brasileira. Bom, RECOMENDO, portanto, Ele está de volta para todo mundo que quer ter um par de horas divertido, assim como também para todo mundo que deseja ver um bom filme e, por fim, para todo mundo, coxinhas e mortadelas, marcianinhos e tucaninhos, cruzeirenses e atleticanos...EVERYONE!!! 



P.S: Se vc já assistiu A Queda! As Ultimas horas de Hitler(2004) vai ter uma surpresa agradável nesse filme...

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

DICA CINEMATOGRÁFICA: O QUE FAZEMOS NAS SOMBRAS - “Cansei de ser vampiro. É uma droga. Não acreditem no hype”

Don't sing if you want to live long
They have no use for your song
You're dead, you're dead, you're dead
You dead and outta this world
You're Dead, Norma Tanega
Daily I remenber
life before the wall
No awkward invitations
we'd just invite then all
Innocence and laughter
we threw it all way
A game of slow disaster
we didn't need to play

Então, antes de mais nada tenho que fazer uma pequena confissão: esse filme me pegou desprevenido. Faz pelo menos dois anos que tomei conhecimento desse longa, mas só essa semana consegui coragem para o assistir. E como me arrependo de não tê-lo assistido antes meus caros leitores imaginários. Posso afirmar sem nenhuma dúvida que é uma das melhores comédias que assisti nos últimos anos! E mesmo agora, escrevendo essa resenha, confesso que tenho crises involuntárias de riso que chegam às lágrimas apenas por pensar nesse filme. Sim, eu sei o que vocês estão pensando, os meus gostos são bem peculiares(para não dizer coisa pior) e, portanto, talvez o filme seja um bocado bizarro para o gosto comum. E provavelmente vocês estão certos, digo, parcialmente certos, porque o filme possui um plot realmente incomum, mas as piadas são realmente boas. Mas sem me alongar mais ainda mais, vamos então à resenha! 
O que fazemos nas sombras, ou What We do in the Shadows, é um filme Neozelandês de 2014, dirigido por Jemaine Clement e Taika Waititi. Se esse ultimo nome lhes pareceu estranhamente conhecido, é porque ele também dirigiu Thor 3: Ragnarok. Assim como nesse ultimo, a graça do filme está na comicidade das ações simplórias de seus protagonistas, que apesar de quaisquer atributos ou características exteriores, são fundamentalmente pessoas comuns, estando sob as mesmas pressões e frustrações cotidianas pelas quais todos passamos. Um exemplo desse humor cotidiano pode ser visto em uma das primeiras cenas do filme, quando Viago, um dos vampiros que mora na casa, tenta reunir os outros vampiros para discutir a limpeza da casa. Qualquer pessoa adulta que já tenha morado em repúblicas ou com amigos, se identifica logo de cara, porque aqui temos todos os arquétipos de "colegas de apartamento" possíveis. O "maníaco por organização", representado por Viago, o "incivilizado imundo" representado por Deacon, o "doce psicopata" representado por Pryt e, o emblemático, "sexualmente mais ativo do que deveria" representado por Vladislav. Além disso, temos outros personagens que incrementam ainda mais o humor do filme, como o vampiro millennial Nick e o esplêndido Stu. Ahhhh... Stu, não existem palavras para dizer como gostei desse personagem. Porque ele representa tudo de normal, cotidiano e "boring" que existe em nosso mundo, sendo sua estoica reação a todo o novo universo que lhe é apresentado,  é capaz de causar crises de riso histéricas.
Além disso, o filme também faz um curioso tributo à todas as obras que retratam os adoráveis sugadores de sangue no cinema. Os personagens principais representam as principais vertentes da representação do vampirismo nas telonas. Pryt, o mais velho de todos, é o clássico vampiro do filme Nosferatu(1922), animalesco e monstruoso. Vladislav, por outro lado, é basicamente o Drácula de Bram Stoker(1994), uma representação menos animalesca, mas ainda agressiva e mítica. Viago, interpretado pelo próprio Waititi, é o típico vampiro dos livros de Anne Rice ou vistos em Entrevista com um Vampiro(1994), refinados predadores das sombras. Deacon, por fim, é o típico vampiro de Garotos Perdidos(1987) ou dos Vampiros de Jonh Carpenter(1998), mais uma criança do caos do que propriamente um vilão. Além disso, o filme faz menções a outros clássicos do gênero, como Blade(1998), Anjos da Noite(2003) e mesmo filmes recentes(e polêmicos), como Crepúsculo(2008)

Tendo em conta tudo o que falei, fica claro que esse filme não tem apenas minha mais sincera recomendação, mas quase uma súplica sincera para que seja visto. RECOMENDO, portanto, esse filme a todos que queiram passar da forma mais absurdamente divertida possível um bom par de horas.



P.S.: Antes que alguém pergunte... sim, esse filme está no catálogo da Netflix!!!

quinta-feira, 30 de novembro de 2017

DICA CINEMATOGRÁFICA : VALERIAN: E A CIDADE DOS MIL PLANETAS - Ou como combustível sólido é ótimo para foguetes e péssimo para relacionamentos



Ground Control to Major Tom
Ground Control to Major Tom
Take your protein pills and put your helmet on
Ground Control to Major Tom (ten, nine, eight, seven, six)
Commencing countdown, engines on (five, four, three)
Check ignition and may God's love be with you (two, one, liftoff)

Space Odity, David Bowie

Your stare makes me freeze but I can't stay still
Those eyes keep me up longer than any other pill
And I know, being together
We feel like forever
and now, more than ever I feel everything (feeling everything)
 

Então... acho que esse vai ser um filme complicado de comentar meus caros leitores imaginários. Faz tempo que eu não encontro um filme ao qual meu apreço e desgosto foram incitados em proporções tão equilibradas. Valerian: A cidade dos mil planetas é o mais novo filme do diretor francês Luc Besson, que tem no currículo filmes como O quinto elemento e O profissional. No entanto, ao contrário dos dois citados filmes que juntos resumem a alma do cinema de uma geração, Valerian não é...tão bom. Obviamente, não estou dizendo que o filme seja ruim, longe disso. No entanto, embora ele seja majestoso em seus visuais, na caracterização do universo da trama e etc, ele peca em um ponto fundamental. Não tem química entre os protagonistas. Eu sei meus caros leitores imaginários, esse clichê do casal de protagonistas que, independente do fato do próprio universo estar em chamas, não conseguem se segurar para se pegar é um saco. Mas quando eles são essencialmente retratados como um casal, é importante que eles, ao menos, pareçam duas pessoas que gostam de conviver uma com o outra. E esse é a grande falha do ambicioso Valerian, ter ambientes e personagens criados inteiramente de CGI que parecem muito mais reais que o relacionamento dos protagonistas.




Estarei sendo muito duro com o filme? Talvez... mas confesso que odeio ver potencial perdido(quando não é o meu, obviamente). Antes de mais nada, é bom que eu esclareça para vocês que o filme foi baseado numa série de quadrinhos francesa, chamada Valérian, Agente Espácio-Temporal. Nessa série, Valerian e Laurerine são basicamente dois super espiões/soldados/heróis que viajam pelo cosmos nas mais diversas e loucas aventuras. Mas uma coisa absolutamente importante sobre a mesma, é o fato dos dois serem nos quadrinhos um casal altamente funcional. Eles parecem pessoas de verdade!!! Claro... tirando o fato de que eles lutam o tempo inteiro contra impérios do mal e civilizações alienígenas no passado e no futuro, mas vocês entenderam meu ponto. Ao contrário do clichê do relacionamento perfeito, o relacionamento de Valerian e Laureline nos quadrinhos é tão quebrado como qualquer relacionamento amoroso da vida real. As páginas da série perpassam por um relacionamento maduro, de pessoas independentes que não estão juntas apenas por um desejo ou força irresistível, mas porque realmente gostam de conviver uma com a outra e tentam fazer seu relacionamento funcionar. 

Mas tirando a total ausência de veracidade no relacionamento dos protagonistas... tenho de confessar que o filme é até bastante agradável. A trama talvez não seja tão boa quanto poderia ser. A narrativa em que o filme se inspira se encontra no sexto volume dos quadrinhos, chamado O Embaixador das Sombras, onde Valerian e uma importante autoridade militar da terra são sequestrados, e Laureline tem de resgatá-los com ajuda de um pequeno sidekick alienígena de incríveis poderes anais(sim, você leu isso). O filme faz uma releitura da trama dos quadrinhos, embora simplificando bastante o plot principal. Obviamente, não vou dar spoilers, mas digamos que já nos minutos iniciais do filme eu tinha uma boa expectativa, senão certeza, de como seria o resto. Isso é ruim? Sem dúvida! Incomum? Não, atualmente é quase impossível não encontrar um filme que não seja infantilmente previsível, então eu diria que isso não é um grande defeito. De resto, o universo ao redor dos personagens é muito crível, embora esteja no limiar tênue entre a fantasia e a ficção científica( temáticas que particularmente aprecio). Praticamente todos os personagens, excluindo os protagonistas, são extremamente interessantes e bem caracterizados. Os ambientes são de encher os olhos em sua inventividade, fazendo bastante jus ao material original e lembrando, embora vagamente, do universo colorido e cosmopolita de O Quinto Elemento.

Fica a pergunta então, Valerian: e a Cidade os Mil Planetas vale a pena ser assistido? E, pessoalmente, eu daria uma resposta positiva, embora não tão assertiva quanto já fiz com inúmeros outros filmes dos quais teci minhas especulações. É um bom filme, mas não um filme extraordinário. Ele poderia ser muito melhor, talvez mesmo memorável... mas mesmo em meio aos seus clichês e a ausência de química no elenco, vê-lo é ainda uma ótima forma de passar o tempo. RECOMENDO O FILME, portanto, a todos que queiram um bom par de horas de diversão apenas, sem nada muito complicado.



P.S.: Fato aleatório, mas a Rihanna faz uma participação belíssima no filme. Isso pode parecer pouco importante, mas a cena em que ela é apresentada é uma das melhores cenas de todo o filme.


terça-feira, 31 de outubro de 2017

DICA CINEMATOGRÁFICA: BAHUBALI - A Construção do Herói Mítico e a Decadência do Gênero Épico


See my chariot run to yor ships I'll drive you back to the sea
You came her for gold he wall will not hold
This day was promissed to me
The gods are my shield lightning and javelins fly
Soon many will fall we are storming the wall
Stones fall snow from the sky

Dovahkiin, Dovahkiin, naal ok zin los vahriin
Wah dein vokul  mahfaeraak ahst vaal
Ahrk fin norok paal graan fod nust hon zindro zaan

Confesso que não é a primeira vez que me defronto com uma obra vinda de Bollwood(um conhecido e carinhoso apelido da indústria cinematográfica indiana). Sendo meu primeiro contato com esse universo colorido e musical os filmes Shingham(2011) e Shinghan Returns(2014), dos quais não só guardo lembranças extremamente agradáveis(sério, os filmes são muito divertidos), como não canso de recomendá-los a qualquer um queira sair um pouco da monotonia sombria e desesperançada dos blockbusters ocidentais. No entanto, nada me prepararia para esse filme tão... singular. E quando digo singular, estou longe de dizer que o filme é ruim ou mesmo estranho. Não, longe disso até. Apenas confesso que em todos esses anos dessa indústria vital a qual chamo de vida, poucas vezes encontrei uma saga que realmente merecesse o título de épico(e aqui coloco a palavra no masculino, já que me refiro ao gênero narrativo). 



Eu sei... eu sei... muitos de vocês, caros leitores imaginários, estão agora mesmo enumerando dezenas de sagas e filmes que se arrogam também como épicos, como Star Wars, O Senhor dos Anéis, Gladiador, Coração Valente e etc. No entanto, embora eu não desmereça esses filmes sempre achei que aos mesmo faltava um certo senso de grandiosidade... ou, melhor dizendo, que esses filmes e, particularmente, seus protagonistas tentavam ser verossímeis demais, demasiadamente humanos. Não me entendam mal, por favor. Obviamente, sei que a verossimilhança é algo importante na construção de uma narrativa e da empatia de seu público por ela. No entanto, a figura do herói, ou melhor, do herói épico é por essência inverossímil, fantástica. Pode-se ver isso, por exemplo, na obra de Homero, pai, senão fundador(ao menos no ocidente) do gênero épico. O protagonista da Odisseia, Ulisses(ou Odisseu) não é apenas um rei, mas descendente dos próprios deuses, sendo que o mesmo acontece ao principal protagonista da Ilíada, Aquiles, cuja própria mãe não é humana, mas uma ninfa do mar. O dois heróis lutam com criaturas fantásticas, flertam com divindades e são capazes de encerrar e iniciar guerras. Ambos estão, obviamente, fora daquilo que se esperaria de um homem comum, ambos caminham com os deuses. O protagonista de um épico, portanto, é por essência algo mais do que um mero humano, flertando continuamente com uma ascensão ao mundo dos mitos. Não tanto um ser de carne e osso, mas uma lenda viva, um mito.



E é justamente nesse ponto que Bahubali: O Início (2015) e Bahubali 2: A Conclusão (2017) acertam. Em toda a história fica claro que os protagonistas não pertencem ao banal e cotidiano mundo dos homens, mas são feitos de um metal muito mais raro, pertencendo essencialmente ao mundo das lendas. Ou seja, ao invés da direção do filme tentar criar mais verossimilhança para a história, fazendo uma narrativa pé no chão, optou-se por uma estilização na elaboração das cenas e narrativas, que não apenas deu um tom idílico à trama, mas reafirmou ainda mais o caráter épico, senão, lendário da mesma. Muito mais do que apenas a simples jornada do herói, temos também a impressão de estarmos acompanhando a construção de uma lenda, de um conto vindo de uma era há muito esquecida e agora pertencente apenas ao mundo dos mitos. Infelizmente, esse tipo de construção narrativa sempre foi bastante incomum no cinema ocidental. Tramas rocambolescas e cenários estilizados poucas vezes renderam boas plateias, sendo que mesmo após o relativo sucesso de 300, um dos poucos filmes que conseguiram se fazer por valer no gênero, poucas obras emplacaram o gênero. Em minha humilde e insignificante opinião, isso acontece em parte porque obras assim costumam ser extremamente caras e arriscadas do ponto de vista comercial. É difícil um público empatizar com um herói virtualmente perfeito ou com uma história muito exagerada. O cinema ocidental se tornou muito caro, e filmes se tornaram investimentos sob o alvitre de hordas de acionistas sem rosto. Obras monumentais como épicos, portanto, são dinossauros que por sua onerosidade extrema enfrentam sua extinção. 


Ai, ai, ai... como de costume, me enrolo em extrapolações e esqueço de falar do dito filme. Vamos então ao mesmo!!! A saga de Bahubali se divide em dois filmes. Bahubali: O início e Bahubali 2: A Conclusão. O enredo se baseia naquele velho clichê de Hamlet(ou O Rei Leão, para os mais jovens). O trono do ancestral reino de Mashimati é usurpado pelo maligno irmão do rei anterior Bhallaladeva(sim, vocês não vão conseguir falar ou sequer lembrar do nome de nenhum personagem do filme, aceitem), cabendo ao filho do antigo rei reaver o trono de seu pai e salvar o reino dos desmandos de seu cruel tio.  No entanto, embora a estrutura do filme seja bastante "padrão" para o gênero aventura/ação, existe uma particularidade muito interessante nesse filme. O protagonista do filme é tanto o filho do rei falecido, como o próprio rei(embora aqui através de flashbacks do passado). Dizendo de uma forma mais clara, tanto pai quanto filho são facetas de um mesmo personagem, dividindo, inclusive, mesmo o nome, Bahubali(obviamente, eles são interpretados pelo mesmo ator). A saga do herói é aqui, portanto, intergeracional. 


Eu sei, eu sei... isso parece muito estranho, mas é necessário se lembrar que o filme se trata de uma obra indiana. Mais do que apenas uma barreira puramente linguística, aqui também se encontra uma previsível barreira cultural. Conceitos como reencarnação, karma e várias idiossincrasias da religiosidade indiana são apresentados aqui de forma crua, sem a enfadonha necessidade de exposição e simplificações para o público ocidental. A obra foi pensada primordialmente para o público indiano e nós, espectadores de além mar, nos vemos desbravando a cada instante do longa um território exótico e fantástico, mas cuja beleza somos incapazes de captar inteiramente. Sim, o filme não é para todos... tenho de admitir. A colorida musicalidade típica de Bollywood provavelmente escandalizará os fãs de ação/aventura mais puristas, fora que o caráter burlesco de várias das situações do filme as vezes podem quebrar a imersão do espectador. Mas... sinceramente? Creio que as vezes devemos sair de nossa zona de conforto e experimentarmos coisas novas e diferentes. Assim sendo, NÃO POSSO DEIXAR DE INDICAR bahubali a qualquer um que queira ter algumas horas divertidas e bastante interessantes. 




P.S: Sim, esse filme está no catálogo da Netflix (tenho quaaaaase certeza). 

sexta-feira, 23 de junho de 2017

DICA CINEMATOGRÁFICA - SAMURAI REBELLION: História Japonesa, Lucha - Lucha e Tragédias


"Dies irae! Dies Illa
Solvet saeclum in favilla
Teste David cum Sybilla!

Quantus tremor est futurus,
quando iudex est venturus,
cuncta stricte discurssurus"

O filme sobre o qual tecerei meus delírios será, dessa vez, Jōi-uchi: Hairyō tsuma shimatsu (上意討ち 拝領妻始末), ou como é mais conhecido no ocidente, Samurai Rebellion, ou simplesmente, Rebelião, um filme japonês, produzido em 1967 e de direção de Masaki Kobayashi. De início, tenho de confessar que não estava muito entusiasmado quanto ao filme. Não que eu não goste de filmes do estilo. Adoro! Mas, sinceramente, esperava o básico de qualquer filme que se pretenda passar no Japão Feudal e que tenha sido produzido há mais de três décadas atrás, ou seja, kattanas, muitas frases de efeito(embora dentro de atuações fracas), e lutas bem coreografadas(embora sem sangue). No entanto, para minha surpresa, me defrontei com pouca ou nenhuma ação(também pouco sangue), e com uma trama que transpirava mais engajamento e tragédia do que muitos filmes contemporâneos que se pretendem sérios. Sendo que confesso que o ponto mais alto do filme, ao menos para mim, foi a relevância e o desenvolvimento que foram dadas à protagonista Ichi, já que, normalmente, em filmes da mesma temática as personagens femininas são completamente planas ou, na melhor das hipóteses, apenas fazem parte do ambiente(com raras exceções, é claro). Na verdade, considerando o tempo histórico em que o filme se passa, poderia até dizer que a personagem possui um talhe quase libertário, senão semi-feminista(com as devidas proporções, claro).
Mas, claro, antes de me perder em minhas teorias e elucubrações, tenho de lhes repassar o plot básico do enredo. Como já disse, a história se passa no Japão Feudal, mais especificamente no período Edo, em uma pequena província, afastada da grandiosa Tóquio feudal e do Xogunato, mas não fora das tortuosas sendas do poder. Por obvio, depois desse pequeno trecho, imagino que seja necessário um pequeno parênteses(sim, pode parar de coçar a cabeça e olhar para a tela desse jeito), para se explicar o que diabos foi o período Edo e o que é o Xogunato. Sem me perder em explicações que vocês poderão encontrar, perfeitamente, no google, faço a seguinte associação que vi em um site: o período Edo seria semelhante à Baixa Idade Média. Nesse período, o xogum(algo semelhante a um rei), exercia seu poder regional através dos Daimyos(a nobreza), que se utilizavam da força dos samurais(a sua cavalaria medieval) para governar e administrar suas terras. Tendo isso claro, pode-se entender mais facilmente o enredo, que, por obvio, dado o título do filme, tem como centro um conflito entre a hierarquia que eu acabo de descrever. 
Quando vejo a cena tenho a impressão que eles, a qualquer momento, vão começar a dançar ao som de Menudos...

Shitt!!! E lá vamos pelo terceiro bloco de texto sem que, uma palavra sequer quanto ao enredo tenha sido realmente dita. É melhor que eu me apresse...bom, na trama, Isaburo é um velho samurai que faz parte da guarda do Daymo. Na verdade, mais do que isso, ele é descrito como o melhor espadachim de toda a região. No entanto, como já disse, ele já era velho e logo passaria seu cargo(tanto profissional quanto de chefe da família) ao seu filho Yogoro, e iria poder, assim, aproveitar sua velhice ao lado de sua esposa, a quem realmente detestava. No entanto, sua vida seria pacata se não tivesse sido requisitado que seu filho, Yogoro, se cassasse com Ichi, uma ex-concubina(expulsa por seu "mau comportamento"), e ainda mãe do herdeiro do Daymo. Como diria a mãe de Yogoro; Isso é uma desonra! Uma razão de vergonha eterna para o clã! Citando, quase literalmente, uma  outra dela fala dela, "a mulher era de segunda mão, tinha mau gênio e, como se isso já não bastasse, já tinha tido um filho!" Sim, essa personagem não era exatamente uma pessoa muito agradável. No entanto, ao contrário do escruciante casamento também forçado de Isaburo, e contra todas as expectativas, Ichi e Yogoro são felizes(um casamento feliz, vê-se aqui que um aspecto de ficção quase fantástica do filme), tendo inclusive uma filha. A vida deles seria boa, se  o Daymo não requisitasse Ichi novamente ao castelo como sua concubina... 
Lucha!! Lucha!!!

Não vou contar mais, porque acabaria dando spoilers sobre a história, que confesso ser muito boa. Não me resta, portanto, nada mais do que recomendá-lo, sendo que então... Recomendo esse filme, portanto, não só para aqueles que gostem do gênero samurai, como também para todos que gostem de um bom e trágico filme.







DICA LITERÁRIA/CINEMATOGRÁFICA: ENDER'S GAME(O JOGO DO EXTERMINADOR) - Video Games, Genocídio e Falhas de Comunição

"No momento em que eu realmente entender meu inimigo, entendê-lo bem suficiente para derrotá-lo, então, neste momento, eu também o amo."
O Jogo do Exterminador

It's all about the game and how you  play it
It's all about control and if you can take it
It's all about your debt and if you can pay it
It's all about the pain and who's gonna make it

War. War Never Changes.

Ender's Game, ou no Brasil, O Jogo do Exterminador, é o primeiro livro de uma das mais aclamadas tetralogias de toda a ficção científica contemporânea. A obra, que se passa em um distante futuro onde a humanidade se defronta com uma nova forma de vida inteligente, discute temas controversos como o abuso infantil, genocídio, a influência política das redes sociais, lavagem cerebral e a racionalização do mal. Eu ainda poderia falar que o livro é uma leitura recomendada por várias organizações militares do mundo, como os United States Marine Corps(os fuzileiros), e que além do prêmio Nebula, o livro ainda ganhou o prêmio Victor Hugo graças a sua excelência. Entretanto, mais do que falar dos méritos do livro, preciso antes fazer uma escusa ao mesmo, digo, me desculpar pelo maior e mais visível obstáculo da obra à aceitação pública, o seu autor. Sim meus amigos leitores imaginários, o autor desse maravilhoso livro, Orson Scott Card, é uma pessoa... controversa


Tá... chamar apenas de controverso alguém que abertamente faz declarações públicas homofóbicas em pleno século XXI, é o mesmo que dizer que o cogumelo atômico de Hiroshima foi uma estalinho  de São João. No entanto, a despeito das declarações do autor condizem muito pouco com a realidade de sua obra, que em sua totalidade traz uma mensagem de tolerância e aceitação quanto ao diferente. Mas como de costume, coloco a carroça na frente dos burros(Sim, sou velho o suficiente para conhecer esse tipo de ditado), me esquecendo de falar do mais importante, do livro em si. Como dizia Jack, o estripador, vamos por partes!!! O enredo da obra se passa no ano de 2136, 50 anos depois de uma invasão alienígena quase ter dizimado a raça humana. Temendo um novo ataque, a humanidade cria uma poderosa força de defesa mundial. Agora, mais do que recrutar massas infindáveis de adultos maduros para combater, as crianças mais dotadas são retiradas das suas famílias e treinadas para se tornar máquinas de guerra perfeitas. No entanto, um problema remanesce, ninguém é capaz de entender as táticas ou mesmo as intenções dos alienígenas, na verdade, sequer sabe-se como os mesmos foram derrotados, sendo que nesse ponto encontramos nosso protagonista/solução, o jovem Ender.


Não posso revelar muito mais do enredo, porque isso poderia trazer spoilers tanto sobre o livro quanto sobre a adaptação cinematográfica do mesmo(que também ficou muito boa). Não posso, entretanto, deixar de elogiar o fato que mesmo publicado em 1977, a obra conseguiu desenvolver muitos conceitos que embora à época não fossem relevantes, hoje são parte importante da forma como nossa sociedade se estrutura, tais como a importância da mídia alternativa e dos blogs no cotidiano político, a utilização de games ou de realidade virtual para treinamento militar e mesmo manipulação psicológica em nível individual e coletivo. Não posso poupar elogios também à sequência O orador dos mortos(ainda estou tentando encontrar Ender, o Xenocída para comprar). Nela, assim como em Ender's Game, temos um dos  insights mais inovadores que já vi serem desenvolvidos em um livro de ficção.
A ideia de que a guerra, o genocídio e a violência, em outras palavras, o extermínio do outro, são essencialmente a consequências de situações onde não existe diálogo. Em outras palavras, não havendo a possibilidade de dialogo entre dois seres, ou duas civilizações, diferentes a violência e a nulificação do outro são a única e trágica resposta possível. Sim, eu sei que parece inicialmente algo tolo, mas praticamente todos os conflitos na história humana podem se explicados em alguma medida por esse conceito. Sejam aliens contra humanos, europeus contra indígenas ou mesmo pequenos conflitos urbanos, todos os conflitos, a violência pura e simples, é uma simples consequência de uma falha de comunicação.

Mas já me demoro demais num texto que deveria ser curto. Então... se recomendo a leitura de Ender's Game? Você leu o que escrevi acima infeliz caro leitor imaginário? Obviamente RECOMENDO, embora, como já disse, eu pessoalmente discorde, e ache mesmo que a própria obra discorda em sua essência, das palavras e posicionamentos tomados por  Orson Scott Card. A propósito, abaixo postei o trailer do adaptação do livro para o cinema. Confesso que gosto mais do livro... mas para os mais preguiçosos entre vocês, meus amados filhos da leitores imaginários, fica a dica.


sexta-feira, 16 de junho de 2017

DICA LITERÁRIA: A Crônica do Matador do Rei - MAGIA, MIOJO E A VIDA UNIVERSITÁRIA



"Há três coisas que todo homem sábio deve temer. O mar em uma tempestade, uma noite sem lua, e a ira de um homem gentil."
A Crônica do Matador do Rei: Primeiro Dia

"I Hurt myself today
To see if still fell
I focus on the pain
The only thing that's real"
Hurt - Trent Reznor(versão no link do Jonny Cash)

O que posso dizer dessa narrativa que mal começou, mas que já considero pacas?!?! Brincadeiras a parte, A Crônica do Matador de Reis( The Kingkiller Chronicle) é o nome do conjunto de obras, ainda em execução, escritas pelo norte americano Patrick Rothfuss. A história, narrada pelo próprio protagonista, embora agora velho e moralmente alquebrado pelo tempo e dissabores, se passa quando o mesmo ainda era jovem, quando ele passava por um dos períodos mais difíceis e desafiadores na vida de qualquer jovem, seja num universo fantasioso, seja no mundo real, se passa durante seu período universitário. Sim, meus queridos leitores imaginários, seja no mundo real comendo diariamente miojo e fazendo das tripas coração para pagar pilhas ridiculamente grandes de apostilados, seja num universo fantástico com magia e perspectivas de vida tristemente mais interessantes que as nossas, a vida de um universitário é padecer no paraíso.



Estarei exagerando? Dramatizando às raias do romanesco sobre uma situação que na verdade não é tão sombria quanto parece? Certamente! E ao mesmo tempo não. O ambiente universitário é, na nossa sociedade, um dos principais ritos de passagem da juventude para a maturidade de parcela considerável da população. É nele que temos, sem demagogias, acesso à ideias, pessoas e universos completamente dissociados de nossas experiência empíricas anteriores. No entanto, é também um ambiente onde nossas concepções de valores e mundo são contestadas, e onde muitas vezes nossa própria identidade é posta em xeque. Em resumo, é o período em que cometemos nossos maiores acertos e erros, estes últimos com maior frequência(Sim, adoro ser dramático).   E talvez seja por isso que A Crônica do Matador do Rei seja tão próxima da nossa realidade. Mais do que apresentar o processo do conhecimento como algo mágico e interessante, aqui vemos um protagonista extremamente humanizado se debatendo contra desafios, obstáculos, realizações e sonhos comuns a todos nós. Temos desde a formação do "grupinho da faculdade" a conhecida ultima chance de termos amigos que nos suportarão até o túmulo(se vc ainda não está num grupinho... SHAME ON YOU, SHAME!!!), a crush por algum motivo aleatório inatingível, o dia em que se encontra finalmente a área em que você vai se especializar( e a sucessão de inumeráveis matérias e áreas do conhecimento que se encontra até lá),  e o maior obstáculo de todos... o vil metal. 


Tá... a narrativa não se centra nas agruras do protagonista Kvothe para arrumar dinheiro e se sustentar(essa é a história da minha vida), mas num interessante nó narrativo que envolve governos medievais ao melhor estilo GoT(Game of Thrones, pelo amor dos sete deuses!!!), um misterioso inimigo que ameaça destruir o mundo, e o próprio protagonista que, no presente da história, é a sombra do homem que foi um dia, por causa de um erro ainda a ser narrado. Fora isso, não posso deixar de mencionar que a tradução em português está belíssima, com uma leitura fluída e maravilhosamente viciante(e vejam bem que não estou sendo pago pelo merchan, mas se quiserem me pagar aceito). O único ponto negativo que posso mencionar, é o espaço temporal excessivo que existe entre cada livro( seriamente, parece que todo autor de fantasia possui um ódio obsceno contra o seu próprio público). De resto, só posso dizer uma coisa... RECOMENDO SERIAMENTE a leitura da saga(ainda incompleta) A Crônica do Matador do Rei, a todos que queiram ler algo menos sombrio que Game of Thrones, mas também não queiram apelar para algo excessivamente juvenil. Em resumo, indico o presente livro para todos que quiserem ter uma boa leitura.